sexta-feira, 7 de julho de 2023

 O Núcleo de Deus no Cérebro Humano

 
      Um dia desses estava na urgência de um hospital desta cidade prestando assistência a uma amiga/paciente, que sofrera um traumatismo craniano por queda em seu domicílio. Num determinado momento, quando a situação parecia sob controle, a paciente passou a apresentar subitamente um quadro de agitação psicomotora e agravamento dos seus sinais vitais. Naquele momento de aflição, quando eu iria sugerir a colega plantonista uma intervenção medicamentosa mais agressiva para conter aquela assustadora crise, eis que sua filha,  muito tensa, parecendo expressar ingenuidade, mas com certeza sua elevada fé em Deus disse, mãe vamos rezar e começou: Ave Maria cheia de graças...Pai Nosso que estais nos Céus, santificado seja o vosso Nome, venha a nós o vosso Reino, seja feita vossa vontade assim na terra como nos Céus... ... Salve, Rainha, mãe de misericórdia, vida, doçura, esperança nossa, salve!... A medida que a sequência de orações foi avançando a paciente foi acalmando progressivamente e adormeceu sem auxílio de nenhuma intervenção medicamentosa.

Este episódio me fez reforçar a convicção de que “um núcleo de Deus” presente no cérebro da paciente fora estimulado com aquelas orações e produziu aquele surpreendente resultado. Nesta perspectiva, como professor aposentado de Fisiologia Humana da Universidade Federal de Sergipe, não hesito em afirmar que estou defendendo um ponto de vista cientificamente sustentável. Senão vejamos:  é conhecimento cientificamente consolidado que nosso cérebro tem áreas sensoriais especializadas na identificação de determinados estímulos específicos tais como audição, gustação, visão, olfação cujo nome tem a ver com as funções especificas que realizam. Portanto nada mais razoável admitir que um núcleo cerebral que é sensível a uma mensagem espiritual seja considerado e denominado um “Núcleo Espiritual” ou “Núcleo de Deus” como tem sido divulgado em algumas publicações cientificas. Aliás este entendimento, de que há uma área cerebral que reúne um conjunto complexos de sinapses cerebrais especialmente sensíveis aos estímulos relacionados à espiritualidade tem sido cientificamente comprovado por exames de imagem conforme demonstrado por pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de Utah, nos Estados Unidos, coordenados pelo neuroradiologista Jeff Anderson (1). Eles, realizaram um experimento com 19 jovens e adultos que seguiam a religião Mórmon. Nesse período, seus cérebros foram escaneados usando um equipamento de ressonância magnética. Os resultado dos  exames revelaram que os sentimentos espirituais ativaram o “Núcleo Accumbens”, região responsável pelo processamento dos circuitos de recompensa e que também era ativada por outras experiências como amor, a música  e  sexo. E também constataram que:  Quando os participantes foram instruídos a pensar sobre um ‘Salvador’, sobre estar com suas famílias eternamente, sobre recompensas celestes, os seus cérebros e corpos responderam fisicamente” (Michael Ferguson, coautor do estudo.)

Portanto, a questão principal em discussão na atualidade é se este núcleo seria uma criação da mente humana ou se nascemos com ele como um desígnio do criador. Ou seja, se o criador nos haveria distinguido das demais espécies nos concebendo com um núcleo cerebral capaz de sentir a nossa ligação espiritual com Ele. Neste campo de reflexão destacam-se duas correntes de pensamento. Uma defendida pelos espiritualistas e outra pelos materialistas.  O ponto crucial de conflito destas duas correntes está relacionado a compreensão se a mente seria produto do cérebro por conseguinte de sua bioquímica ou a mente seria algo imaterial que transcende os limites do cérebro e que teria alcance inimagináveis.

Para os que acreditam que a mente é produto de reações químicas cerebrais, o instigante fato relatado acima seria resultado de um processo de desenvolvimento da fé, trabalhada ao longo da vida pela nossa estimada amiga. Com certeza, neste caso eu poderia confirmar que este processo realmente existiu. Trata-se de uma pessoa que sempre buscou em Deus a força para superar suas adversidades. E este núcleo repetidamente exercitado na caminhada da vida produziu naquele momento a resposta compatível com a fé em Deus que sempre nutriu ao longo da sua existência. Mas a questão mais importante que não pode ser desprezada é se este núcleo já existia dentro dela e foi desenvolvido com o exercício da fé em Deus ou se ele foi gerado a partir da pratica espiritual frequente. Para investigarmos esta questão torna-se necessário avançarmos além dos limites da neurofisiologia e fazermos uma incursão na história de nossos antepassados, sua origem e sua evolução.

Nesta senda, ao nos debruçamos sobre a história de escravizados, indígenas e diversos povos que cronologicamente nos antecederam vemos que muitas vezes estas populações são avaliadas de forma preconceituosa e são estigmatizados como primitivos, culturalmente inferiores e até selvagens. Porem se nos despojarmos do olhar colonialista, veremos que todos esses povos originários tinham rituais e práticas espirituais elevadas e relações estreitas com suas divindades. Portanto a história isenta de preconceito nos revela que precedendo a civilização, o homem primitivo acreditava na existência de uma dimensão que transcendia os limites do mundo material e que alimentaram suas crenças,  mitos,  cultos e deuses.

Por outro lado, ao aportarmos a essa discussão a teoria da evolução das espécies (Charles Darwin) vamos nos defrontar  com uma questão polêmica envolvendo a ciência e a religião, pois segundo esta teoria é o ambiente, por meio de seleção natural, que determina a característica do indivíduo que o tornaria mais bem adaptado ao local em que vivia  e portanto com maiores chances de sobrevivência se contrapondo portanto aos ensinamento bíblicos, segundo os quais o homem, assim como tudo o que existe no Universo, é criação de um ser superior e segue os seus desígnios.

  Segundo a teoria evolucionista o “Homo Sapiens Sapiens”, nome dado à espécie dos seres humanos, evoluiu a partir do Homo erectus, espécie antecessora que surgiu há cerca de 1,5 milhões de anos e já possuía características fisiológicas bastante semelhantes ao do homem moderno. Antes do seu surgimento, aproximadamente 300 mil anos atrás, outras subespécies de “Homo Sapiens” habitaram a Terra, no entanto apenas o “Homo Sapiens Sapiens” conseguiu sobreviver.  Não se sabe exatamente a causa deste feito, no entanto a maioria dos pesquisadores defende que, provavelmente a capacidade do “Homo Sapiens Sapiens” de pensar e criar, os capacitou para responder de diferentes formas às diferentes situações adversas, constituindo-se fator decisivo para sua sobrevivência.

Para os espiritualistas o “Homo Sapiens Sapiens”, dominou todas as outras classes por uma inteligência especial, ilimitada, que lhe dá a consciência do seu futuro, a percepção das coisas imateriais e o conhecimento de Deus. Ou seja  a natureza espiritual do homem exerceu predomínio sobre sua natureza  material  capacitando-o  a vencer os desafios para sua sobrevivência e experimentar em sua consciência a sensação  da perenidade. Esta linha de raciocínio nos permite defender a idea de que o surgimento do núcleo da espiritualidade na espécie humana possa ter se constituído no marco mais importante da evolução da nossa espécie extrapolando as suas características biológicas adaptativas. Esta característica surgida num determinado momento da nossa cadeia evolutiva nos distinguiu de todos as outras criaturas ao possibilitar a interação criatura/criador através de processos espirituais como a oração. Sem sombra de dúvidas esta capacidade amplia a possiblidade de superar desafios e encontrarmos soluções em situações que parecem intransponíveis, por nos permitir acessar forças que transcendem os limites do mundo material .

Pelo exposto, creio que nascemos trazendo uma caraterística única entre todas as espécies, uma área cerebral sensível a estímulos espirituais, que possibilita fazermos uma ponte com o mundo imaterial. Esta capacidade ao nosso ver é o nosso potencial divino, que poderá ser desenvolvido ou não pela prática espiritual. Lamentavelmente, pelas amarras do mundo material, ao invés de aprendermos a desenvolvê-la, aprendemos a bloqueá-la.  Mas, com certeza esta qualidade faz parte da nossa essência e felizes aqueles que num momento de aflição, conseguem fazer uma ponte com Deus, acessando forças poderosas que transcendem o nosso conhecimento e são capazes de produzir resultados que a ciência muitas vezes não consegue explicar.

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(1)Religious Experiences Activate Same Brain Pathways As Sex And Drugs - https://www.iflscience.com - published November 29, 2016